sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Abolição do Objeto de Desejo

   É interessante abolir a noção de "objeto de desejo", como sendo alguém que investimos de desejo. A noção mais difundida de objeto é a de objeto-imóvel-para-apreender, ou objeto-passivo-para-amar. Tanto que, quando falamos em objetização da mulher, em geral estamos falando de tomá-la como objeto-inerte-para-consumo, ou seja, quando se aceita uma quantia dinheiro (ou outra coisa) como equivalente-geral para a imagem - ou mesmo para o próprio corpo feminino, numa relação na qual a própria pessoa (a mulher ) não é sujeito - não participa (por exclusão) do processo de negociação, ou de produção de transferência, ou de codificação.

   Então criamos uma nova forma de dizer que supõe uma prática de liberdade no outro investido, e que portanto supõe uma relação de poder (no sentido foucaultiano: não como uma relação de dominação, mas como um jogo de interesses em que todxs participam). Chamemos o que desejamos de "sujeito de desejo". Esse termo também é interessante porque carrega a suposição de um desejo no outro, ou seja, a relação envolve um outro desejante que pode aceitar, não aceitar, coproduzir, modificar ou mesmo desconstruir nosso investimento, além de produzir os seus próprios investimentos.

   Mas mesmo os objetos de desejo (coisas desejadas que não desejam - no sentido psicológico de desejo - ou seja, objetos sem psique, "inanimados") são construídos costumeiramente como mais estáveis do que nós (que criticamos os essencialismos) supomos que realmente sejam. Então mesmo o que chamaríamos "legítimo objeto de desejo" é usualmente tornado menos "ativo" e dinâmico (movimentado!) do que é na (nossa visão) da realidade. Por exemplo, no sentido físico, podemos dizer que não enxergamos (com nossos olhos) os movimentos mais sutis do objeto (as vibrações das partículas, por exemplo).

   Mas temos que parar e refletir, porque esse desejo "psicológico" não é o que tomamos para falar de política molecular, ou micropolítica.

    Não queremos que nosso movimento seja uma simples sobrecodificação do corte com a natureza. Não é pra ser isso. Ou seja, queremos é reconhecer o que se entende com os termos e usar nossa criatividade para inaugurar sentidos que possibilitem evitar a reprodução de termos "conservadores".
   Então: não é que hajam coisas investidas de desejo e coisas não investidas, ou coisas que investem e que não investem de desejo... é só que isso se maquina diferente: os objetos só podem investir de desejo porque os sujeitos agenciam os objetos. O "vice-versa" só se funda a partir do desejo do "vivo", ou seja, não há política sem vida, não há desejo sem sujeito, e o objeto é o "inanimado" que, sem 'psique', pode investir apenas porque o sócius é agenciado por máquinas-desejantes... Essa disjunção (homem-natureza) só precisa ser feita porque ela já é feita e porque a noção instituída de objeto resiste à desapropriação. Na (nossa atual) verdade, como já dissemos, todo objeto é sujeito. Mas é uma maquinação específica das coisas que chamamos de desejo, e essa maquinação requer máquinas-desejantes. AÍ é que surge o corte, aí é que o homem se coloca como quase-causa da natureza: quando ela surge, tudo sempre foi e sempre será político.

    No fim das contas, é falar "sujeito de desejo" por aí, mesmo para os "objetos", porque estão sujeitos a e são sujeitos de desejo.

    Abraços.

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